Super Bock Super Rock 2018: a Moura de Benjamin Clementine


No terceiro e último dia da 24ª edição do Super Bock Super Rock, o Parque esteve longe de cheio, mas estivemos entre amigos: a organização convidou os festivaleiros a trazerem um amigo e estes celebraram a caminho das bilheteiras. A reta final do festival contou com artistas como Isaura, Stormzy, Sevdaliza, Benjamin Clementine e Julian Casablancas + The Voidz. Um Super Bock Super Rock de boas memórias.

Isaura abriu o Palco EDP e não foram muitos os festivaleiros presentes para acompanhar o concerto da artista, não fosse a primeira voz de um dia que não trouxe muita gente. Para muitos, esta é "apenas" a vencedora da final do Festival da Canção: trouxe O Jardim, também com a voz de Cláudia Pascoal, a música que representou o nosso país na Eurovisão. Contudo, nem só de Eurovisão se fez Isaura: também foi uma das caras (ou vozes) da plataforma de streaming portuguesa, Tradiio. A artista escolheu o Parque para apresentar o seu álbum de estreia, Human, e trouxe temas como I Need Ya, Human e Busy Tone. Convidou ainda Diogo Piçarra para cantar Closer, música produzida em conjunto com o músico algarvio, e Meu é Teu, música à qual Isaura empresta a sua voz em português. Foi a banda sonora do fim da tarde para muitos casais da comunidade LGBT, que preencheram aos poucos os recantos do Pavilhão e se abraçavam ao som das letras emocionais da artista. Uma das vozes mais melodiosas do indie e alternativo nacional, não deixou de mostrar o seu talento e surpreender todos aqueles que não conheciam o seu trabalho.

Isaura @ Super Bock Super Rock 2018

Baxter Dury foi o segundo a subir ao Palco EDP neste último dia. Pode não parecer, mas é um dos grandes senhores do rock britânico. O filho de Ian Dury veio mostrar porque é que sabe homenagear o nome do seu falecido pai. Veio apresentar o seu último álbum, Prince of Tears, com músicas que mostram várias facetas da sua personalidade. Ao seu lado e atrás, esteve uma banda que ajudou os temas do disco a manifestarem-se melhor ao vivo. O seu charme engraçado conseguiu encantar o público que assistia. 

Baxter Dury @ Super Bock Super Rock 2018 

O londrino Stormzy aterrou em Lisboa para marcar a sua estreia no nosso país. O filho do grime - o movimento iniciado em Londres nos anos 2000 - veio mostrar porque é que este género musical se continua a alargar e a espalhar-se fora do Reino Unido. DJ Tiiny, que o acompanhou nos beats, começou por passar temas de Skepta, que se estreou em Portugal no ano passado, e God's Plan de Drake enquanto nos ecrãs se liam frases como: "This is god’s plan, they can never stop this", "Don’t talk bad if you don’t talk facts", "Who’s gonna stop me? You? Him?", entre outras. Remetendo à última citação, ninguém o parou durante uma hora. Entrou em palco com First Things First e percorreu o seu primeiro álbum, Gang Signs & Prayer, passando por Cigarettes & Cush (a calorosa colaboração com Kehlani e Lily Allen), o remix de Shape of You (o tema de Ed Sheeran) e a explosiva Big For Your Boots. Stormzy confessou que tinha algum receio de apresentar as suas músicas fora do seu país, mas após este concerto qualquer medo que tinha desvaneceu-se. O público recebeu-o bem com moshes e a saltar ao som dos seus temas mais mexidos. A sua energy crew (o título que dá aos seus fãs) portou-se bem e deixou-o feliz a fazer a promessa de regressar. A humildade e boa-disposição de Stormzy tornam-no num dos artistas do grime mais acarinhado pelas pessoas, e neste comprovou-se isso mesmo. Podia não ser um dos nomes mais esperados do dia, mas foi um dos que surpreendeu mais pela positiva. E sim, há espaço para este estilo musical além de Inglaterra.

Stormzy @ Super Bock Super Rock 2018

Foi fácil perder a conta ao número de pessoas que viu barrada a entrada no Cinema São Jorge, depois de um Vodafone Mexefest a rebentar pelas costuras. O motivo opera de outro mundo e chama-se Sevdaliza. A artista iraniana-holandesa regressou pela terceira vez a Portugal, desta vez para hipnotizar o Palco EDP do Super Bock Super Rock. Dona de uma voz poderosa o suficiente para derreter diamante, consegue controlar ao milímetro cada movimento do seu corpo e transformar-se num centro de gravidade, quase como se tornasse humanamente impossível desviar o olhar. Sevda é uma fusão entre a electrónica e a emoção arrebatadora, equilibrando a sensualidade da voz aguda com o futurismo das samples. A expectativa miudinha que recaía sobre Human e a possibilidade de se transformar em Humana era expressa em tom de piada, mas a plateia entrou em êxtase quando ouviu Eu sou / Eu tenho / Eu inspiro / Eu respiro no começo de Human(a), a fazer companhia ao riso inicial da cantora. Conquistou o espaço com temas como Other Girl, Marilyn Monroe ou Observer e ninguém ficou indiferente. No final, Sevdaliza desceu à grade e trocou palavras carinhosas com os fãs, que fizeram os possíveis para abraçar a artista. Esperemos que regresse brevemente ao nosso mundo.

Sevdaliza @ Super Bock Super Rock 2018

Poucos são aqueles que não tiveram, pelo menos, uma oportunidade para ouvir a voz de Benjamin Clementine em concerto. Quem diz uma, diz uma das 14 vezes, correspondentes ao número de atuações do músico inglês em Portugal. Não foi isso que impediu que enchesse razoavelmente a Altice Arena e proporcionasse um dos concertos mais arrepiantes de todo o festival. A perfomance de Benjamin não sofre grandes alterações: Benjamin sobe, de pés descalços, ao palco com os seus instrumentos, as vozes que constituem o seu coro e as figuras singulares que ocupam o espaço que ficaria por preencher. E não deixa o palco sem nos fazer acreditar que a sua voz é capaz de nos transportar para outro plano da realidade. Desta vez, o inglês trouxe temas como Phantom of Aleppoville, Condolence e Jupiter. Para além destes, Portugal subiu ao palco e também desceu à plateia: não só a fadista Ana Moura cantou I Won't Complain de maneira inesquecível, a pedido de Benjamin, como também os membros da plateia foram convidados a gritar Adios, com todo o ar dos seus pulmões. Benjamin disse que se vai "lembrar de Portugal para sempre" e nós temos a certeza que Portugal também se irá lembrar para sempre dele, até mesmo quando nos manda calar. 

Benjamin Clementine @ Super Bock Super Rock 2018

Não há palavras (boas) para Julian Casablancas + The Voidz. Talvez não existam sequer palavras, visto não termos conseguido ouvir em condições durante um bom tempo após o (deprimente) espectáculo proporcionado pelo antigo menino de ouro dos The Strokes. A confirmação deste nome como cabeça de cartaz levantou algumas ondas de confusão, mas a expectativa ficou em banho-maria com o nome de Julian Casablancas; excepto que esse banho-maria acabou por queimar o tacho. O artista chegou ao palco completamente alienado daquilo que acontecia à sua frente e pouco faltou para subir a um pedestal imaginado por ele mesmo, perante o desastre de concerto que tentou dar. As pessoas ficaram na expectativa de algum bocadinho de The Strokes, que pudesse salvar os seus tímpanos daqueles gritos, típicos de mau heavy metal. No meio da desafinação, da gritaria, do desespero auditivo, ouvimos QYURRYUS, Pointlessness e Human Sadness. E tivemos I'll Try Anything Once. Infelizmente, o Anything Once desta edição foi esta memória auditiva tão pouco feliz.

Julian Casablancas & The Voidz @ Super Bock Super Rock 2018

Sofi Tukker, a dupla nova-iorquina formada por Sophie Hawley-Weld e Tucker Halper, trouxe ao Palco Somersby o EDM electrizante com a influência contagiante do bossa-nova. Foram várias as interrogações sobre a identidade da vocalista Sophie, afinal "será que é portuguesa?" ou "isto é português?" acompanharam a sonoridade de temas como Drinkee ou Energia. Portuguesa não é, mas disfarça-o bem: os tempos passados a aprender português e conhecer os ritmos do Brasil contribuem para o enriquecimento do espectáculo que proporcionam. As interações com o público arrancaram sorrisos de Sophie e Tucker não deixou de incentivar que todos fizessem parte da pista de dança em que se transformou a Sala Tejo. Envoltos numa atmosfera descontraída, trouxeram ainda Batshit, Best Friend e Fuck They, tornando impossível não dançar até ao último segundo. A música uniu forças com a genuinidade e fez nascer uma noite de dança, de movimento e som, que assentou que nem uma luva naquele que foi, para muitos, o final desta edição do Super Bock Super Rock

Sofi Tukker @ Super Bock Super Rock 2018

Texto: Carina Soares & Iris Cabaça
Fotos: Iris Cabaça
Super Bock Super Rock 2018: a Moura de Benjamin Clementine Super Bock Super Rock 2018: a Moura de Benjamin Clementine Reviewed by Carina Soares on agosto 02, 2018 Rating: 5

Slideshow