Vodafone Paredes de Coura 2018: politizar a música, musicar a política


Ao terceiro dia de Vodafone Paredes de Coura, o corpo já pedia uma pausa, é verdade. Não fosse pela energia estrondosa de Skepta ou pela rebeldia anarquista de Pussy Riot, este teria sido facilmente o dia mais calmo na vida dos festivaleiros no habitat natural da música.



A Vodafone Music Session deste dia foi com os Imarhan, numa pedreira. Um cenário improvável com uma banda imprevisível. O quinteto vem da Argélia e tem apenas dois álbuns no reportório (Imarhan e Temet). Revelaram-se uma boa surpresa porque as suas músicas estão repletas de diversidade cultural. Deu para dar uns passos de dança durante este concerto secreto.

A abrir o Palco Vodafone, este Lucy Dacus. A cantora e compositora norte-americano veio aquecer a tarde com o seu indie rock sonhador. Com a sua voz doce e letras carregadas de esperança, encantou o público e este terceiro dia não podia ter começado de melhor forma.



No Palco Vodafone FM, Frankie Cosmos chegou ao nosso país com o seu último disco Vessel, que foi lançado em março deste ano. Com a voz doce de Greta Kline, tornaram o concerto num momento acolhedor.


DIIV eram talvez um dos regressos mais aguardados neste cartaz, visto que a última vez que tocaram em Portugal foi em 2013, no NOS Alive. Vieram mostrar o seu último álbum, Is the Is Are (2016). As suas músicas psicadélicas resultaram bem no público do festival e foi bom voltar a vê-los. Ao longo do espetáculo, mostraram imagens aleatórias de Kurt Cobain, Angel Olsen, Badbadnotgood e Sunflower Bean, os últimos atuaram no festival em 2017. Porém, não foi um concerto muito memorável, e até as interações com o público foram um bocado estranhas porque quase ninguém percebia o que estava a acontecer. A banda disse várias vezes “make DIIV cool again” e isso devia mesmo voltar a ser real.

Passaram pelos "festivais do norte" em 2014 e 2015: NOS Primavera Sound e Vodafone Paredes de Coura, respectivamente. Depois de um hiatus de 22 anos, voltaram a pisar os palcos do Lisboa ao Vivo e do Hard Club para apresentar o álbum homónimo, que agitou os fãs do dream pop e do shoegaze. E foi como se nunca tivessem ido embora. De regresso ao habitat natural da música, a banda de Berkshire mostrou que a melancolia faz parte do sonho e ocupou o silêncio com temas dos seus quatro álbuns, com um acentuado destaque para Souvlaki (1993) e Slowdive (2017). Rachel Goswell, sempre de sorriso nos lábios, tomou conta do palco Vodafone com a sua voz harmoniosa. Ao seu lado, tinha Neil Halstead, artista cuja voz parece figurar a versão audível de um abraço apertado. Em conjunto, criaram uma experiência sonora trascendente, que levou a audiência a fechar os olhos e esquecer que existia um mundo exterior, fora do criado pelas guitarras persistentes do shoegaze. Para começar esta experiência, Rachel trouxe Slomo, pertencente ao mais recente álbum;  a plateia vibrou com When the Suns Hits, Crazy for You ou Star Roving. Houve tempo para Sugar for the Pill e para Golden Heart, cover de Sid Barrett, o ponto de encerramento deste espectáculo, com uma Rachel afastada do palco e uma intensa explosão de guitarras, que se sobrepunham e completavam de forma magnífica. Um equilíbrio bem conseguido entre os êxitos de pedra e cal e os êxitos pintados de fresco, reinventados por uns Slowdive cada vez mais cientes do impacto emocional e libertador das suas criações.



Skepta foi o primeiro artista de grime a atuar no festival. Passou por Portugal no ano passado, no NOS Primavera Sound, e correu tão bem que voltou cá. Apresentou-se como “um instrutor de fitness” e muito exercício foi feito durante o seu concerto, incluindo muitos saltos e moshes. Da primeira fila até acima, via-se o público todo a saltar ao som do álbum Konnichiwa (2016), o qual dominou o alinhamento. A “energy crew”, como Skepta chama os seus fãs, fez jus ao nome. A frase “let’s get fucking grimey” foi o mote para a hora que se seguia. As suas letras sobre questões raciais no Reino Unido, como Shutdown, causaram bastante impacto. A perspetiva é de um país diferente, mas o sentimento é comum por todo o lado. Este concerto, um dos mais marcantes do festival, foi a prova de que nomes do grime ou hip-hop são bem recebidos em Paredes de Coura e são algo em que se deve apostar.

Perante a sua confirmação, Pussy Riot trouxeram consigo uma onda de dúvida: Então, afinal dão concertos em festivais? Como será um concerto deste grupo ativista? Onde é que se encaixarão nos palcos do Vodafone Paredes de Coura? A resposta chegou-nos através da manifestação política que fez vibrar o chão que rodeou o Palco Vodafone FM. Liderados pela ativista Nadya Tolokonnikova, Pussy Riot invadiram Coura com balaclavas e mensagens revolucionárias, que surgiram uma atrás da outra, sem espaço para deixar o público recuperar dos gritos sucessivos de incentivo e concordância. Foram mensagens contra o regime oligárquico de Putin, contra a corrupção russa, contra as desigualdades sociais, contra os maus tratos aplicados a ativistas em regime prisonal. Ainda antes do FUCK PUTIN que fechou o espectáculo, os fãs deliraram, saltaram e gritaram temas como Straight Outta Vagina, Make America Great Again ou Bad Apples. Um concerto com uma mensagem de inconformismo às normas sociais e de luta revolucionária contra a opressão política. Um concerto onde a música e a política se uniram, de punho erguido.

Vodafone Paredes de Coura 2018: 3º dia

Texto: Carina Soares & Iris Cabaça
Fotos e vídeo: Iris Cabaça
Vodafone Paredes de Coura 2018: politizar a música, musicar a política Vodafone Paredes de Coura 2018: politizar a música, musicar a política Reviewed by Carina Soares on setembro 17, 2018 Rating: 5

Slideshow